Teorema de Heine-Borel

Em matemática, o teorema de Heine-Borel ou teorema de Borel-Lebesgue, estabelece que em R n {\displaystyle \mathbb {R} ^{n}\,} um conjunto é compacto se e somente se é fechado e limitado.

Discussão

Um conjunto K {\displaystyle K\,} é dito compacto se apresentar a seguinte propriedade:

Toda cobertura aberta admite uma subcobertura finita. Ou seja, se O λ {\displaystyle O_{\lambda }\,} são conjuntos abertos indexados por um índice λ I {\displaystyle \lambda \in I\,} e:
K λ I O λ {\displaystyle K\subseteq \bigcup _{\lambda \in I}O_{\lambda }\,}

Então existe uma família finita { O λ n } n = 1 N {\displaystyle \left\{O_{\lambda _{n}}\right\}_{n=1}^{N}\,} que cobre K {\displaystyle K\,} :

K n = 1 N O λ n {\displaystyle K\subseteq \bigcup _{n=1}^{N}O_{\lambda _{n}}\,}

Esta propriedade é chamada de propriedade de Heine-Borel ou propriedade de Borel-Lebesgue.

Um conjunto F {\displaystyle F\,} é dito fechado se toda sequência convergente contida em F {\displaystyle F\,} converge para um ponto de F {\displaystyle F\,} , ou seja:

x n F  e  x n x {\displaystyle x_{n}\in F{\hbox{ e }}x_{n}\to x\,} , então: x F {\displaystyle x\in F\,}

Um conjunto é dito limitado se estiver contido em alguma bola de raio finito.

Um lema sobre a distância de um compacto a um ponto fora dele

Mostraremos que se K {\displaystyle K} é um conjunto compacto e x K {\displaystyle x^{*}\notin K} então existe um número δ > 0 {\displaystyle \delta >0} , tal que:

| x y | δ , y K {\displaystyle |x^{*}-y|\geq \delta ,\forall y\in K}

Para tal, defina:

r ( y ) = | x y | 2 , y R n {\displaystyle r(y)={\frac {|x^{*}-y|}{2}},\forall y\in \mathbb {R} ^{n}}

É claro que r ( y ) > 0 {\displaystyle r(y)>0\,} para todo ponto y {\displaystyle y\,} em K {\displaystyle K\,} .

Agora construa os abertos:

O y = B ( y , r ( y ) ) , y K {\displaystyle O_{y}=B(y,r(y)),\forall y\in K} , ou seja, a bola de centro y e raio r ( y ) {\displaystyle r(y)\,}

Eles formam uma cobertura para K {\displaystyle K} :

K = y K { y } y K O y {\displaystyle K=\bigcup _{y\in K}\{y\}\subseteq \bigcup _{y\in K}O_{y}}

Usando a definição de compacidade, estabelecemos a existência de um conjunto finito de pontos y 1 , y 2 , , y n K {\displaystyle y_{1},y_{2},\ldots ,y_{n}\in K\,} tais que:

K k = 1 n O y k {\displaystyle K\subseteq \bigcup _{k=1}^{n}O_{y_{k}}}

Por construção, os abertos O y {\displaystyle O_{y}\,} são disjuntos das bolas centradas em y {\displaystyle y^{*}\,} de raio r ( y ) {\displaystyle r(y)\,} :

O y B ( x , r ( y ) ) = B ( y , r ( y ) ) B ( x , r ( y ) ) = {\displaystyle O_{y}\bigcap B(x^{*},r(y))=B(y,r(y))\bigcap B(x^{*},r(y))=\emptyset }

Defina:

δ = min k = 1 n r ( y k ) {\displaystyle \delta =\min _{k=1}^{n}r(y_{k})\,}

temos:

O y k B ( x , δ ) = B ( y k , r ( y k ) ) B ( x , δ ) = B ( y k , r ( y k ) ) B ( x , r ( y k ) ) = , k = 1 , , n {\displaystyle O_{y_{k}}\bigcap B(x^{*},\delta )=B(y_{k},r(y_{k}))\bigcap B(x^{*},\delta )=B(y_{k},r(y_{k}))\bigcap B(x^{*},r(y_{k}))=\emptyset ,\forall k=1,\ldots ,n}

Tomando a união, temos:

K ( B ( x , δ ) ) ( k = 1 n O y k ) B ( x , δ ) = {\displaystyle K\bigcap \left(B(x^{*},\delta )\right)\subseteq \left(\bigcup _{k=1}^{n}O_{y_{k}}\right)\bigcap B(x^{*},\delta )=\emptyset }

Pela definição da bola B ( x , δ ) {\displaystyle B(x^{*},\delta )\,} , temos que todo ponto do conjunto K {\displaystyle K\,} está a uma distância não inferior a δ {\displaystyle \delta } , o que completa a demonstração.

Compacto implica fechado

Seja K {\displaystyle K\,} um conjunto compacto e seja K c {\displaystyle K^{c}\,} seu complementar. O lema anterior mostra que K c {\displaystyle K^{c}\,} contém uma bola aberta em torno de cada um de seus pontos, logo é aberto.

Compacto implica limitado

Seja um conjunto não limitado, então ele possui uma seqüência com as seguintes propriedade:

  • | x n + 1 | > | x n | {\displaystyle |x_{n+1}|>|x_{n}|\,}
  • | x n | {\displaystyle |x_{n}|\to \infty \,}

Construa a cobertura:

O n = B ( 0 , | x n | ) {\displaystyle O_{n}=B(0,|x_{n}|)\,}

A união dos O n {\displaystyle O_{n}\,} cobre todo o espaço, mas nenhuma subcobertura finita cobre toda a seqüência x n {\displaystyle x_{n}} .

Assim, nenhum conjunto não-limitado é compacto.

Fechado e limitado implica compacto

Vamos utilizar o argumento do teorema de Bolzano-Weierstrass.

Para tal, considere um conjunto K {\displaystyle K\,} fechado e limitado e suponha, por absurdo, que não seja compacto, ou seja, que exista uma cobertura de abertos e não admita subcobertura finita.

Por ser limitado, deve estar contido em algum hipercubo:

  • K [ a 1 1 , b 1 1 ] × [ a 1 2 , b 1 2 ] × × [ a 1 n , b 1 n ] {\displaystyle K\subseteq [a_{1}^{1},b_{1}^{1}]\times [a_{1}^{2},b_{1}^{2}]\times \ldots \times [a_{1}^{n},b_{1}^{n}]}

Faço bisseção de cada uma das arestas do hipercubo, de forma a obter 2 n {\displaystyle 2^{n}\,} hipercubos menores. Considere os subconjuntos formados pela intesecção de K {\displaystyle K\,} com cada um destes hipercubos menores. Pelo menos um desses conjuntos não pode ser coberto com uma subcobertura finita.

Prossiga o argumento recursivo para obter uma seqüencia de conjuntos fechados (pois cada hipercubo é fechado e a intersecção de fechados é um fechado) encaixados cujo diâmetro tende a zero. Aplique o teorema de Cantor para obter um ponto na intersecção de todos estes fechado que não pode ser coberto por subcobertura finita. Um absurdo.

Aplicação

A forma com que se foi apresentado aqui os conjuntos compactos, podemos fazer uma ilustração com um importante resultado utilizado na Análise: funções contínuas levam conjuntos compactos em conjuntos compactos. De modo geral, esta propriedade vale para quaisquer espaços topológicos.

A seguir apresentaremos uma versão desse teorema para a análise real, considerando os conjuntos em R {\displaystyle R} . O resultado que será apresentado seguirá de sua respectiva demonstração e vale lembrar que em outros contextos (ou seja, considerando X {\displaystyle X} em alguma outra topologia que não seja R {\displaystyle R} a demonstração seguirá da mesma forma já que usamos resultados que valem de mogo geral.

Teorema: Considere f {\displaystyle f} uma função contínua de R {\displaystyle R} em R {\displaystyle R} . Sendo X R {\displaystyle X\subset R} compacto, então f ( X ) {\displaystyle f(X)} é compacto.

Demonstração: Dada uma cobertura qualquer de abertos para f ( X ) {\displaystyle f(X)} de forma que f ( X ) i U i {\displaystyle f(X)\subset \bigcup _{i\in \vartriangle }U_{i}} e onde cada U i {\displaystyle U_{i}} é aberto. Daí,

X f 1 ( i U i ) X i f 1 ( U i ) {\displaystyle X\subset f^{-1}{\Bigl (}\bigcup _{i\in \vartriangle }U_{i}{\Bigl )}\Rightarrow X\subset \bigcup _{i\in \vartriangle }f^{-1}(U_{i})}

Como U i {\displaystyle U_{i}} é aberto e f {\displaystyle f} é contínua então f 1 ( U i ) {\displaystyle f^{-1}(U_{i})} é aberto para todo i {\displaystyle i} . Além disso, já que X {\displaystyle X} é compacto, então podemos extrair uma subcobertura finita de abertos da qual temos pelo Teorema de Borel-Lebesgue. Daí, existe k N {\displaystyle k\in N} de modo que

X i = 1 k f 1 ( U i ) f ( X ) i = 1 k U i {\displaystyle X\subset \bigcup _{i=1}^{k}f^{-1}(U_{i})\Rightarrow f(X)\subset \bigcup _{i=1}^{k}U_{i}}

Ou seja, dada uma cobertura qualquer de abertos, conseguimos uma cobertura finita para f ( X ) {\displaystyle f(X)} . Logo este conjunto é compacto.

Referências

  • MILIOLI, SIMONE DA LUZ. Conjuntos Compactos. 2000, UFSC. Disponível em<https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/97155/Simone_Milioli_da_Luz.PDF?sequence=1>
  • Portal da matemática